domingo, 15 de maio de 2011

Um amigo...

Milan Kundera, escritor tcheco, escreveu em seu último livro, "A
Identidade", que a amizade é indispensável para o bom funcionamento da
memória e para a integridade do próprio eu. Chama os amigos de
testemunhas do passado e diz que eles são nosso espelho, que através
deles podemos nos olhar. Vai além: diz que toda amizade é uma aliança
contra a adversidade, aliança sem a qual o ser humano ficaria desarmado
contra seus inimigos.



Verdade verdadeira. Amigos recentes custam a perceber essa aliança, não
valorizam ainda o que está sendo contruído. São amizades não testadas
pelo tempo, não se sabe se enfrentarão com solidez as tempestades ou se
serão varridos numa chuva de verão. Veremos. 

Um amigo não racha apenas a gasolina: racha lembranças, crises de choro, experiências. Racha a culpa, racha segredos
Para que serve um amigo? Para rachar a gasolina, emprestar a prancha,
recomendar um disco, dar carona pra festa, passar cola, caminhar no
shopping, segurar a barra. Todas as alternativas estão corretas, porém
isso não basta para guardar um amigo do lado esquerdo do peito.



Um amigo não empresta apenas a prancha. Empresta o verbo, empresta o ombro, empresta o tempo, empresta o calor e a jaqueta.


Um amigo não recomenda apenas um disco. Recomenda cautela, recomenda um emprego, recomenda um país.


Um amigo não dá carona apenas pra festa. Te leva pro mundo dele, e topa conhecer o teu.


Um amigo não passa apenas cola. Passa contigo um aperto, passa junto o reveillon.


Um amigo não caminha apenas no shopping. Anda em silêncio na dor, entra contigo em campo, sai do fracasso ao teu lado.


Um amigo não segura a barra, apenas. Segura a mão, a ausência, segura
uma confissão, segura o tranco, o palavrão, segura o elevador.


Duas dúzias de amigos assim ninguém tem. Se tiver um, amém.

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